Luiz de Souza Artes
Este é meu cantinho. Mas onde não me escondo e ao contrário solto o verbo!
sábado, 17 de julho de 2010
O que há de concreto em um feto?
Meu nome é Jorjão. E nem pense seja Jorge e eu o tenha colocado no aumentativo. É Jorjão mesmo! Sempre detestei os diminutivos que os pais colocam em nós para nos chamar quando crianças. Jorginho nunca foi comigo, Jorge é muito comum. Desde pequeno, já me tratava como Jorjão e assim sempre foi e será! Filho meu será atleta e não poeta! E eu penso ÃO, não inho.
Jorginho, Junhinho, Fabinho, são coisas de boiola. De cantores de pagode que tingem o cabelo de loiro e colocam brinquinho para agradar menininhas. Falando em samba, bons só do Zeca, do Martinho, do Neguinho (da Beija Flor) – esses inhos até perdôo – da Lecy BrandÃO... Samba? Samba não, SAMBÃO! Pra agitar o esqueleto e fazer a patroa requebrar. Pagode? Só no quinto dia útil do mês...
E o que falar dos sertanejos? Bons mesmo só os antigos. O modÃO sertanejo... As músicas do TIÃO Carrero, não essas duplinhas com calças jeans apertadas, quase entrando no rego e com bola de meia na frente para aumentar o volume... Calça apertada é para mulher! Se reparar na voz desses caras, são mais finas que das irmãs GalvÃO...
Delicadeza é para mulher... Elas nasceram para ser fracas. Feitas para nos servir e depender da gente. Se vangloriam por nos carregar por nove meses na barriga, pagamos com juros, pois as carregamos nas costas a vida inteira.
E essas que querem ser independentes? Conquistar seu espaço... Engraçado... Nunca as vi querer conquistar espaço para serem borracheiras, mecânicas, chapas, caminhoneiras... Só querem carginhos, diretoria... presidente...
Você já viu alguma mulher rica casando com pobre? Se são pobres, sonham em casar com homem rico, se são ricas, querem ser independentes...
Por isso não dou moleza. Meu pai disse que até para nascer, eu fui durão. A “velha” teve de fazer parto normal, coisa de mulher-macho e eu dei muito trabalho. Até para nascer eu já tinha personalidade! Talvez minha rebeldia ao deixar o ventre tenha sido por causa da covardia que há por aí, mas após dar um baita suador na velha, eis que aqui estou! Se o mundo é uma selva, o melhor é ser leÃO!
Por isso não nasci para perder! Chororô é para os fracos! O segundo é o primeiro dos perdedores! Se a muié chiar muito, eu boto pra correr.
Pra correr mesmo! Idiota de quem deixa a casa pra madame e ainda paga pensão para ela gastar com o RICARDÃO...
Foi assim com a última e agora estou de gata nova. Uma pichulinha lá da Zona Sul, mesmo bairro onde moram meus amigos JULHÃO, TONHÃO e PAULÃO! De vez em quando tenho que dar um perdido nela pra dar uns rolê cos cara...
Inclusive, ela também é durona, pois já botou marmanjo para correr por ter dado uns bolos nela. Mas homem que é homem, enrola sem dar na cara. Os bananas lá eram fraquinhos de idéia...
Já eu sou mais BONZÃO. Mostro pra ela como as coisas são. Tem que estar sempre cheirosinha, depiladinha, pois perna peluda quem tem é homem. E tem que ser depilação com cera quente, pois lâmina deixa o bagulho cerrado igual barba.
Ela até reclama que dói, pois se puxa os pelos todos de uma só vez, mas pra me possuir, tem que fazer valer o sacrifício, até mesmo ficar um final de semana em casa sozinha pra eu poder ir ver o MENGÃO e tomar umas com os amigos.
Claro que não sou Mané, então meus trutas me ajudaram e engrupir a gata, confirmando que eu estava doente. Como não tenho telefone na goma, a gatinha acreditou e jurou ficar em casa pensando em mim.
E o baratão foi da hora mano! O Mengão socou uns quatro. Depois, como tava sem grana para pagar o BUZÃO pra ir pra casa, meus trutas me convidaram pra passar a noite lá na goma deles. Se precisasse, com certeza a dona Dita arrumaria uns trocados pra poder pegar o circular.
A coroa foi firmeza, deu tanta grana que a gente até resolveu comprar umas cervas pra comemorar. Tomamos várias e antes de ir pro quarto, Tonhão preparou uma gororoba pra gente.
Tipo assim: Só tinha um fundo de arroz e feijão grudado no fundo de cada panela, pois sua mãe não nos esperava pra jantar. Então o Tonho tratou de juntar tudo numa mesma panela e jogou mais uns bagulhos lá dentro. Catchup, maionese, mostarda. Até mesmo o óleo da frigideira que a mãe do Julho tinha fritado lingüiça.
Mano! O barato ficou Bom! Está certo que quase quebrei o prato de tanto bater a concha tentando desgrudar o rango, mas dentro da boca, nem precisava mastigar e o bagulho descia macio. No final até teve briga pra raspar o fundo da panela, que é claro, o CARA aqui ganhou.
Como já era tarde, achei melhor bodar por lá. Usamos o resto’ da grana pra comprar mais cerva. A coroa arrumou um colchão e eu tratei de expulsar o Paulão pro chão, pois tomo conta do barato.
O quarto dos caras é para fora, porque a gente sempre chega de matina e não quer incomodar a velha. Tem TV e até um banheiro – sem porta, porque homem que é homem, não precisa fechar porta para passar um fax.
Até tava passando um filminho da hora, daquele americano que era concorrente do Rambo e agora é governador. Só que o filme era que ele estava grávido, mó comédia. Ri muito, mas logo apaguei com a tela ainda ligada.
Sabe aquele barato que você está dormindo, mas meio que acordado? Pois é, parecia que eu ouvia tudo o que falava na TV, só que o barato estava estranho. Tá certo, sempre quis ser o Scwarzenegga, durão, fortão, soca a bifa em todo mundo, mas esse papo de engravidar não é comigo não! E outra, por onde vai sair o bacuri?
Pombas mano! Acordei assustado porque o baratão tava louco! Senti até minha barriga estufada e o neném parecia que estava chutando. Olhei e a televisão tava desligada e os truta dormia. Senti um alívio, mas meu pesadelo resolveu me atacar acordado mermo! Meu filho queria nascer, mas se parecia mais com um bloco de concreto dentro de minha barriga!
E rugia igual quando nóis lá na obra deslizamo eles nas tábuas pro servente pegar lá embaixo.
Matei a charada, o rango do Tonhão não tinha feito digestão e parecia transformado em uma daquelas pedras que o resto de concreto forma quando cai no chão! Tentei arrotar pra dar uma aliviada, mas o bagulho saiu por baixo. O som foi igual quando a gente dá partida em um motor de polpa...
Logo depois o cheiro impregnou tudo. Olhei pros caras e eles ainda pareciam dormir, mas o Julhão, que estava ao meu lado começou a suar e os outros logo depois. Achei que também estavam grávidos, mas acho que foi o cheiro do neném prestes a chegar que os deixou assim.
Fiquei alguns minutos deitado achando que o barato ia passar, mas aí ele quis vir de uma vez. Ainda bem que o banheiro era do lado e por não ter porta, pude sentar na privada bem rápido. Não dava para abrir as pernas como as mulheres fazem no parto normal, então só torci para que outra coisa se abrisse e o pimpolho viesse logo.
Mas o danado puxou o pai e resolveu também me dar trabalho mano! Além de grande, devia ser cabeçudo igual meu avô e teimoso igual Jegue! Neste caso, preferia que fosse um Jegue, pois dizem que eles nascem pelos pés e não pela cabeça! Quando pensava que agora ia, um movimento de meus camaradas na cama, fazia o bagulho voltar pra dentro. De repente tive a sensação que não seria filho único e que brigavam entre si para sair. Mas o maiorzão anarquista ficava tomando a frente.
Nessa hora me lembrei da minha avó, que disse ter tido minha mãe de cócoras e levantei-me um pouco apoiando com as duas mãos na parede. Fazia força e nada... Acho que quando nascesse, ia ter que recorrer a pontos cirúrgicos para voltar meu orifício no tamanho normal...
Mano! Teve hora que deu vontade de chorar! Se o bagulho era de concreto, as pedrinhas deviam ser bem pontudas! Achei que se caísse de uma vez, iria até trincar o vaso!
Meu parto estava tendo complicações e não tinha ninguém para me acudir...
Comecei a pensar na minha mina e também na minha avó, que foi parteira e poderia voltar lá do tal de além pra me dar uma mão!
Resolvi me ajoelhar e fazer uma prece para o santo maior para me ajudar porque não conseguia dar um perdido no pivete...
Acho que nesse instante, algo mágico aconteceu... Não sei se for delírio por causa da dor, mas senti a presença de minha mina ali, como se estivesse do meu lado. Estendi a mão e ela pareceu segurar, me dando a maior força, tipo, como os marido faz naquela hora!
“Empurra! Empurra vai! Força!... Você consegue! Acredita!”
Fechei os zóio! Saiu até lágrima! Mas nessa hora, o bicho desceu duma vez! O filho da mãe puxou o pai e foi tão rebelde que resolveu grudar nos meus pentelhos retais, mas com a velocidade de sua saída, me provocou a primeira depilação anal da história...
Não sei se pulei nesta hora ou logo em seguida quando senti a tal famosa “sensação profunda”...
Após o refresco provocado pelo mergulho de meu atleta, logo em seguida veio os irmãozinhos, mas a porta já estava aberta e foi só felicidade...
Rebelde este menino! Rebelde e anarquista, pois pichou todo o vaso durante a descarga, enquanto descia rodando... E o caçulinha era mais rebelde ainda porque tive que encher a caixa d’água várias vezes, pois o filho da mãe sempre voltava...
Agora o dia já raiou e, após a experiência consumada, parabenizo todas as mulheres, sejam as guerreiras, ou as mais delicadas, pois agora sei que o mundo lhes pertence.
E é com este pensamento que despeço-me de vocês caros amigos e rumo como filho pródigo à casa de minha solene, angelical e amada namorada, para lhe pedir dinheiro pra voltar pra casa, pois gastamos tudo o que dona Benedita nos deu com cerveja.
Atenciosamente, Jorge...
A dor do parto sensibiliza o homem...
terça-feira, 13 de julho de 2010
As Crônicas de Valdo
Oi! Você conhece o Valdo? Talvez ele more em sua cidade, seu bairro e até mesmo quem sabe, na sua rua! Valdo não teve internet, jogos on-line, blogs ou e-mails.
Mas conseguiu fazer de seu pequeno mundo um ótimo recanto de histórias...
A PROFESSORA
Cursava a oitava série pela segunda vez, não, nunca fui um repetente, mas naquela época aprendia com os amigos que o sabor das loiras geladas nas quintas e sextas na esquina da Julio de Mesquita com General Osório, era bem mais gostoso que o cheiro de giz e análise sintática. Isso culminou em minha primeira desistência em um ano letivo.
Posso dizer que durante o tempo que estudei, tive vários professores que marcaram minha vida. Para mim é uma das profissões mais nobres que existem, principalmente em nosso país que tanto desvaloriza esse profissional e muitos acabam exercendo essa profissão por ideal e não apenas oficio.
O ano em questão marcou muito, não só pelas músicas da época – ainda tocadas até hoje, mas pela amizade inocente que tínhamos. Amigos que existem até hoje, no meio de tantos que conhecemos posteriormente, mas sem as mesmas raízes e histórias para contar.
Tivemos ótimos professores neste ano e em sua maioria do sexo feminino. Todas eram jovens e uma delas – a que lecionava história – tinha o costume de se sentar sobre sua mesa, de perfil e com uma das pernas sempre acima da outra exibindo suas belas curvas.
Vivia literalmente “babando” naquilo e católico de carteirinha, condenava meus impulsos tendo que me confrontar com meu subconsciente, até que um amigo dissesse que se acabava no banheiro durante o intervalo após assistir suas aulas.
Isso foi um alivio, não era o único “monstro” da face da Terra, e nem chegava a conseqüências de fazer “sexo manual” com ela, como meu amigo. Mas foi bom saber que não era o único que a desejaria em uma cama, embora talvez nem soubesse ao certo o que fazer se um dia essa oportunidade chegasse.
Mas não é dessa professora que falarei a seguir, aliás sempre fui muito “do contra”: Enquanto dizem que o vermelho nas mulheres enlouquece os homens, sou apaixonado por mulheres que vestem branco. Enquanto admiram e sonham com musas do carnaval, suas curvas e silicones além é claro as “magrinhas” do mundo fashion, prefiro as mulheres comuns, com seus defeitos e qualidades, desde que natural.
Por isso que a professora citada não era a de História, com sua exuberância e pernas que me quebrariam em dois, mas uma baixinha, também de coxas grossas que lecionava matemática...
Seu nome era Helena. Não, não mesmo! Não sou fã do Manoel Carlos e essa pessoa era real.
Com cabelos ondulados até acariciar os ombros, pequenas sardas no rosto e olhos negros com cílios avantajados, Helena possuía uma paciência de monge. Nunca alterava seu tom por mais que a provocassem e até eu – revoltado com uma de suas difíceis tarefas – fui surpreendido com o tom carinhoso de sua resposta após uma reclamação áspera.
Nunca a vi gritar, embora muitos alunos de quinze anos com mentalidade de sete merecessem. Sempre piscava duas vezes em velocidade lenta antes de responder à uma “ofensa” e tinha milhares de defensoras em seu nome em nossa classe.
Comecei a achar que talvez fosse solitária, que houvesse vazio em sua vida a ser preenchido. Apesar de ser quase dez anos mais novo, sempre fui alto desde a adolescência e isso me fazia pensar que poderia ser este homem que ela tanto precisava.
Este é mais um dos “defeitos” que possuo em relação aos outros homens – gostar de mulher mais velha. Descobri isso já no primário, quando percebi que o carinho que sentia pela minha primeira professora me causava arrepio, aumento de batimentos e dificuldades de “fazer pipí”.
Talvez Helena precisasse de mim para colocar os garotos bagunceiros em seu lugar. Para levá-la para sair e depois deixá-la em casa. Para um beijo em sua porta e depois partir cheio de alegrias – a pé, é claro, pois só fui aprender a dirigir seis anos depois e ter um carro em sete.
O ano voou e matemática era minha matéria predileta. Adorava ver sua paciência em esperar os alunos retardatários antes de apagar a lousa, sentando-se na quina de sua mesa, efeito que esticava sua calça jeans e realçava a marca de sua calcinha – Ah! Talvez coubessem duas professoras de história dentro dela.
Fui o primeiro da classe em sua matéria – e em terminar logo de copiar as tarefas do quadro negro. Antes do quarto bimestre, estava aprovado e mesmo assim não perdia nenhuma aula posterior e me orgulhava em exibir as notas subseqüentes que não mais se faziam necessárias.
Com as férias, não pude ver mais a professora e suas piscadas suaves dominavam meus sonhos.
De tanto desejar, um encontro repentino finalmente aconteceu:
Estava no centro da cidade, era Office-Boy e esperava o semáforo de pedestres liberar a principal avenida daquele local, quando a vi deixar o banco que era o meu destino e também aguardar a troca de luzes para vir em minha direção.
Não havia me visto de imediato e quando olhou para mim, o tempo pareceu parar e os breve minutos do semáforo pareceram-se horas.
O som de uma canção romântica do Cutting Crew tocava em minha mente, sendo interrompida brutamente como se alguém tivesse puxado o braço da vitrola:
Um homem claro, franzino e com uma breve calvície deixou o mesmo banco, chegando à faixa de pedestre e a puxou pelo braço.
Apesar do movimento de um horário de pico, pude ouvir claramente sua voz:
“Vamos logo! Não tenho o dia inteiro!”
Helena olhou para mim e os olhos negros e brilhantes tornaram-se tristes. Arregalou-os numa velocidade jamais presenciada e fez-me um sinal negativo com a cabeça como se me implorasse para não fazer algo:
“Anda! Parece uma lesma!” – disse o rapaz, que parecia zangado.
Helena deu-lhe as mãos no momento que o sinal abriu. Bárbara foi a brutalidade com alguém que sempre presenteou seus inferiores com sabedoria e ponderância, que fiquei inerte, atrapalhando quem passava até que o semáforo fechasse novamente.
Acho que chegaram a passar por mim, mas a cena que vi foi outra. Era como se o rapaz lhe tivesse desferido um soco que a fizesse ir ao chão. Em seguida dado vários chutes na barriga e por fim grudado-lhe os cabelos e a arrastado escada acima até sumir na entrada da agência.
Na verdade sumiram na multidão como um fantasma e nunca mais a vi novamente, principalmente por ingressar no segundo grau e mudar de colégio.
Hoje muitos anos passados, posso dizer que sou um homem feliz. Não sofro mais por ninguém, pois meu coração está quase totalmente falecido devido a tantos golpes impiedosos que levou durante sua saga romântica.
E é do fundo desse meu coração em necrose que desejo à Helena que também seja feliz onde quer que esteja.
Querem saber? Desejo nada!
Quem mandou escolher o cara errado?
Arte: Paula Frade
Mas conseguiu fazer de seu pequeno mundo um ótimo recanto de histórias...
A PROFESSORA
Cursava a oitava série pela segunda vez, não, nunca fui um repetente, mas naquela época aprendia com os amigos que o sabor das loiras geladas nas quintas e sextas na esquina da Julio de Mesquita com General Osório, era bem mais gostoso que o cheiro de giz e análise sintática. Isso culminou em minha primeira desistência em um ano letivo.
Posso dizer que durante o tempo que estudei, tive vários professores que marcaram minha vida. Para mim é uma das profissões mais nobres que existem, principalmente em nosso país que tanto desvaloriza esse profissional e muitos acabam exercendo essa profissão por ideal e não apenas oficio.
O ano em questão marcou muito, não só pelas músicas da época – ainda tocadas até hoje, mas pela amizade inocente que tínhamos. Amigos que existem até hoje, no meio de tantos que conhecemos posteriormente, mas sem as mesmas raízes e histórias para contar.
Tivemos ótimos professores neste ano e em sua maioria do sexo feminino. Todas eram jovens e uma delas – a que lecionava história – tinha o costume de se sentar sobre sua mesa, de perfil e com uma das pernas sempre acima da outra exibindo suas belas curvas.
Vivia literalmente “babando” naquilo e católico de carteirinha, condenava meus impulsos tendo que me confrontar com meu subconsciente, até que um amigo dissesse que se acabava no banheiro durante o intervalo após assistir suas aulas.
Isso foi um alivio, não era o único “monstro” da face da Terra, e nem chegava a conseqüências de fazer “sexo manual” com ela, como meu amigo. Mas foi bom saber que não era o único que a desejaria em uma cama, embora talvez nem soubesse ao certo o que fazer se um dia essa oportunidade chegasse.
Mas não é dessa professora que falarei a seguir, aliás sempre fui muito “do contra”: Enquanto dizem que o vermelho nas mulheres enlouquece os homens, sou apaixonado por mulheres que vestem branco. Enquanto admiram e sonham com musas do carnaval, suas curvas e silicones além é claro as “magrinhas” do mundo fashion, prefiro as mulheres comuns, com seus defeitos e qualidades, desde que natural.
Por isso que a professora citada não era a de História, com sua exuberância e pernas que me quebrariam em dois, mas uma baixinha, também de coxas grossas que lecionava matemática...
Seu nome era Helena. Não, não mesmo! Não sou fã do Manoel Carlos e essa pessoa era real.
Com cabelos ondulados até acariciar os ombros, pequenas sardas no rosto e olhos negros com cílios avantajados, Helena possuía uma paciência de monge. Nunca alterava seu tom por mais que a provocassem e até eu – revoltado com uma de suas difíceis tarefas – fui surpreendido com o tom carinhoso de sua resposta após uma reclamação áspera.
Nunca a vi gritar, embora muitos alunos de quinze anos com mentalidade de sete merecessem. Sempre piscava duas vezes em velocidade lenta antes de responder à uma “ofensa” e tinha milhares de defensoras em seu nome em nossa classe.
Comecei a achar que talvez fosse solitária, que houvesse vazio em sua vida a ser preenchido. Apesar de ser quase dez anos mais novo, sempre fui alto desde a adolescência e isso me fazia pensar que poderia ser este homem que ela tanto precisava.
Este é mais um dos “defeitos” que possuo em relação aos outros homens – gostar de mulher mais velha. Descobri isso já no primário, quando percebi que o carinho que sentia pela minha primeira professora me causava arrepio, aumento de batimentos e dificuldades de “fazer pipí”.
Talvez Helena precisasse de mim para colocar os garotos bagunceiros em seu lugar. Para levá-la para sair e depois deixá-la em casa. Para um beijo em sua porta e depois partir cheio de alegrias – a pé, é claro, pois só fui aprender a dirigir seis anos depois e ter um carro em sete.
O ano voou e matemática era minha matéria predileta. Adorava ver sua paciência em esperar os alunos retardatários antes de apagar a lousa, sentando-se na quina de sua mesa, efeito que esticava sua calça jeans e realçava a marca de sua calcinha – Ah! Talvez coubessem duas professoras de história dentro dela.
Fui o primeiro da classe em sua matéria – e em terminar logo de copiar as tarefas do quadro negro. Antes do quarto bimestre, estava aprovado e mesmo assim não perdia nenhuma aula posterior e me orgulhava em exibir as notas subseqüentes que não mais se faziam necessárias.
Com as férias, não pude ver mais a professora e suas piscadas suaves dominavam meus sonhos.
De tanto desejar, um encontro repentino finalmente aconteceu:
Estava no centro da cidade, era Office-Boy e esperava o semáforo de pedestres liberar a principal avenida daquele local, quando a vi deixar o banco que era o meu destino e também aguardar a troca de luzes para vir em minha direção.
Não havia me visto de imediato e quando olhou para mim, o tempo pareceu parar e os breve minutos do semáforo pareceram-se horas.
O som de uma canção romântica do Cutting Crew tocava em minha mente, sendo interrompida brutamente como se alguém tivesse puxado o braço da vitrola:
Um homem claro, franzino e com uma breve calvície deixou o mesmo banco, chegando à faixa de pedestre e a puxou pelo braço.
Apesar do movimento de um horário de pico, pude ouvir claramente sua voz:
“Vamos logo! Não tenho o dia inteiro!”
Helena olhou para mim e os olhos negros e brilhantes tornaram-se tristes. Arregalou-os numa velocidade jamais presenciada e fez-me um sinal negativo com a cabeça como se me implorasse para não fazer algo:
“Anda! Parece uma lesma!” – disse o rapaz, que parecia zangado.
Helena deu-lhe as mãos no momento que o sinal abriu. Bárbara foi a brutalidade com alguém que sempre presenteou seus inferiores com sabedoria e ponderância, que fiquei inerte, atrapalhando quem passava até que o semáforo fechasse novamente.
Acho que chegaram a passar por mim, mas a cena que vi foi outra. Era como se o rapaz lhe tivesse desferido um soco que a fizesse ir ao chão. Em seguida dado vários chutes na barriga e por fim grudado-lhe os cabelos e a arrastado escada acima até sumir na entrada da agência.
Na verdade sumiram na multidão como um fantasma e nunca mais a vi novamente, principalmente por ingressar no segundo grau e mudar de colégio.
Hoje muitos anos passados, posso dizer que sou um homem feliz. Não sofro mais por ninguém, pois meu coração está quase totalmente falecido devido a tantos golpes impiedosos que levou durante sua saga romântica.
E é do fundo desse meu coração em necrose que desejo à Helena que também seja feliz onde quer que esteja.
Querem saber? Desejo nada!
Quem mandou escolher o cara errado?
Arte: Paula Frade
segunda-feira, 12 de julho de 2010
A Ximbica
Trecho de "As Crônicas de Valdo"
Infelizmente este termo não era usado em função de seu significado, mas de forma ofensiva. Da mesma maneira que alguém possa chamar alguém de rebento, associando-o a algo nojento.
Ela era de poucas palavras, aliás, pouco associável. Apesar de seus costumes chamarem a atenção, era incapaz de causar comoção à sua volta além de provocar repulsa aos adultos e até mesmo medo nas crianças.
Ximbica fora um apelido posto por alguém que se mantém anônimo à alguém que possuía um e o seu era Maria, embora quase ninguém fizesse questão de lembrar.
Jamais saberemos o nome do iníquo – talvez de seus discípulos – numa peculiar tradição tupiniquim de alcunhar pessoas por seus defeitos, mesmo que inócuos, realçando-os ao extremo e fazendo-os tomar por completo o espaço das virtudes.
Maria Ximbica – nome de batismo, sobrenome imposto pela pseudo-criatividade – era uma pessoa humilde, de faceta fechada e realçada pelas rugas.
Seu barraco, em um terreno dominado pelo brejo, soava às crianças como mal-assombrado – talvez por idéia de uma cuidadosa mãe, isso nunca saberemos ao certo – de tentar evitar que seu prodígio molestasse a pobre velha, ou se sujasse nas lamas de seu pântano. A bruxa não possuía caldeirão, nem cozinhava as pessoas, mas usava um penico para lavar sua roupa.
Aos adultos apenas restava a pena. Não por compaixão, mas repulsa travestida em piedade. O dó dedicado aos inferiores, que serve para enaltecer os comedores de mortadela e arrotadores de peru.
A tristeza transpunha a alegria, pois apesar de viver em um barraco, seu bairro não era favela. Assim fosse, seus vizinhos se julgariam semelhantes e sua casa não assustaria crianças à noite e nem causaria vergonha aos pais durante o dia.
Pegar uma bola em seu terreno era um risco mortal. Principalmente se seu histórico, tivesse se chocado com as sustentações de seu teto. Mais seguro era atirar pedras – não teríamos que buscá-las de volta.
“Sempre vá você! E antes que a bruxa saia!”
Uma bola rasgada com tesoura doeria em nossa barriga e soaria de sua parte como estripamento, e por outra como vingança por ausência de dias tranqüilos. Mas essa ameaça era insuficiente, pois seu erro já viera na natalidade. Os incomodados que se mudem e deixe os incomodadores em paz.
“Se não quer bola em seu terreiro, que faça um muro!...”
O lado próximo ao seu quintal era sempre o melhor para se brincar. A tal ponto de contrariar a ordem dos pais, pois o delito possui mais sabor e o aparecimento da bruxa, – eterna intrusa da rua mesmo tendo chegado antes – seria um arauto para castigos vindouros.
Por muitas vezes apanhei e a vingança eram as pedras. Mas não adiantava as executar em horário que os pais estivessem em trabalho, pois a maquiavélica as guardava para entregar aos nossos e o castigo vinha em peso dobrado.
A bruxa invadiu meus pesadelos. E também minhas diversões em frente à TV, no seriado mexicano em que ocupava o “apartamento” 71.
O mal deixa raízes e todos víamos na forma de minha prima birrenta, que apelidávamos de “manteiga derretida”.
Ela parecia cevar, pois sempre a chamava em sua casa para lhe dar pedaços de bolo de fubá, que só a tonta comia, pois não éramos bobos de comer um bolo envenenado...
Mas minha prima não naufragou em seu pântano, muito menos foi transformada em sapo, ao contrário cresceu, teve belos filhos, os trata com muito amor e não depende de ninguém.
Assim como a velha Ximbica, que até os fins de seus dias viveu sem incomodar os parentes, fazendo seus bolos de fubá e lavando sua roupa no penico...
Infelizmente este termo não era usado em função de seu significado, mas de forma ofensiva. Da mesma maneira que alguém possa chamar alguém de rebento, associando-o a algo nojento.
Ela era de poucas palavras, aliás, pouco associável. Apesar de seus costumes chamarem a atenção, era incapaz de causar comoção à sua volta além de provocar repulsa aos adultos e até mesmo medo nas crianças.
Ximbica fora um apelido posto por alguém que se mantém anônimo à alguém que possuía um e o seu era Maria, embora quase ninguém fizesse questão de lembrar.
Jamais saberemos o nome do iníquo – talvez de seus discípulos – numa peculiar tradição tupiniquim de alcunhar pessoas por seus defeitos, mesmo que inócuos, realçando-os ao extremo e fazendo-os tomar por completo o espaço das virtudes.
Maria Ximbica – nome de batismo, sobrenome imposto pela pseudo-criatividade – era uma pessoa humilde, de faceta fechada e realçada pelas rugas.
Seu barraco, em um terreno dominado pelo brejo, soava às crianças como mal-assombrado – talvez por idéia de uma cuidadosa mãe, isso nunca saberemos ao certo – de tentar evitar que seu prodígio molestasse a pobre velha, ou se sujasse nas lamas de seu pântano. A bruxa não possuía caldeirão, nem cozinhava as pessoas, mas usava um penico para lavar sua roupa.
Aos adultos apenas restava a pena. Não por compaixão, mas repulsa travestida em piedade. O dó dedicado aos inferiores, que serve para enaltecer os comedores de mortadela e arrotadores de peru.
A tristeza transpunha a alegria, pois apesar de viver em um barraco, seu bairro não era favela. Assim fosse, seus vizinhos se julgariam semelhantes e sua casa não assustaria crianças à noite e nem causaria vergonha aos pais durante o dia.
Pegar uma bola em seu terreno era um risco mortal. Principalmente se seu histórico, tivesse se chocado com as sustentações de seu teto. Mais seguro era atirar pedras – não teríamos que buscá-las de volta.
“Sempre vá você! E antes que a bruxa saia!”
Uma bola rasgada com tesoura doeria em nossa barriga e soaria de sua parte como estripamento, e por outra como vingança por ausência de dias tranqüilos. Mas essa ameaça era insuficiente, pois seu erro já viera na natalidade. Os incomodados que se mudem e deixe os incomodadores em paz.
“Se não quer bola em seu terreiro, que faça um muro!...”
O lado próximo ao seu quintal era sempre o melhor para se brincar. A tal ponto de contrariar a ordem dos pais, pois o delito possui mais sabor e o aparecimento da bruxa, – eterna intrusa da rua mesmo tendo chegado antes – seria um arauto para castigos vindouros.
Por muitas vezes apanhei e a vingança eram as pedras. Mas não adiantava as executar em horário que os pais estivessem em trabalho, pois a maquiavélica as guardava para entregar aos nossos e o castigo vinha em peso dobrado.
A bruxa invadiu meus pesadelos. E também minhas diversões em frente à TV, no seriado mexicano em que ocupava o “apartamento” 71.
O mal deixa raízes e todos víamos na forma de minha prima birrenta, que apelidávamos de “manteiga derretida”.
Ela parecia cevar, pois sempre a chamava em sua casa para lhe dar pedaços de bolo de fubá, que só a tonta comia, pois não éramos bobos de comer um bolo envenenado...
Mas minha prima não naufragou em seu pântano, muito menos foi transformada em sapo, ao contrário cresceu, teve belos filhos, os trata com muito amor e não depende de ninguém.
Assim como a velha Ximbica, que até os fins de seus dias viveu sem incomodar os parentes, fazendo seus bolos de fubá e lavando sua roupa no penico...
domingo, 20 de dezembro de 2009
A Estrela Cadente – Completo
A Editora Multifoco editou o conto "A Estrela Cadente" cortando o parágrafo final do texto. Para alguns pouco afetou e para a maioria, tirou todo o lirismo da história fazendo-a ter um final abrupto.
Para quem gostaria de conhecer a versão original, posto-a aqui agora:
A Estrela Cadente
Por que a felicidade chega sem avisar e da mesma maneira nos deixa? Infelizmente, lampejos de tristeza nos marcam mais que os de alegria e é esta história que conto-lhes agora...
Não saberia dizer que parte mais falta em mim. Que ingrediente fora dosado de maneira incorreta, não causando a tão desejada “química” com os outros de meu meio.
Sou uma pessoa considerada “dispensável”. Daquelas que ninguém sente a falta caso você não vá à uma festa. Que chega a atrair amigos, mas logo eles parecem se enjoar e sem breve aviso, simplesmente te abandonam.
Não! Não sou uma pessoa feia, mas também não me acho encantadora. Creio faltar aquele ingrediente para o bolo, a cereja para dar charme, seja ela um penteado, ou mesmo a maneira correta de se vestir.
Talvez o fato de ter passado toda a minha infância na zona rural tenha-me feito uma genuína cabocla, que não conseguiu se adaptar aos novos amigos da cidade e, por mais que me esforçasse, jamais consegui tornar-me elegante mesmo comprando roupas sofisticadas, que pareciam nunca combinar com meu corpo.
Evitando me tornar um exemplo real de como a realidade imita a ficção e não trazer à vida a personagem ridicularizada por amigos nos filmes americanos, voltei às origens e hoje vivo isolada aqui, no sítio que era da família.
Confesso que já tive meus amores e desejos, mas nenhum deles correspondeu. Entreguei inclusive minha virgindade a alguém que pouco caso fez assim que a conquistou mesmo sendo após muita insistência.
Acho que o problema não são os outros, mas talvez eu mesma, ou até mesmo minha existência. Sendo assim, isolo-me neste meu pequeno mundo e em plena era espacial, evito ligar a televisão, ou qualquer meio de comunicação com o mundo externo, para evitar possíveis arrependimentos de uma vida há muito tempo deixada para trás. Assim sendo, minha melhor companhia são minhas criações e plantas.
Todas as noites, como em um ritual usado por milhões de pessoas no horário nobre em frente seus aparelhos de TV, sento-me sob o pé de seringuela próximo ao lago e de lá fico contemplando o céu, pois nenhuma tela digital por maior e moderna que seja, conseguirá fazer surtir o efeito do espaço mestre.
Sei que lá em cima a batalha continua, sendo perceptível a olho nu apenas durante a noite e quando estes conflitos ocorrem muito perto, o que não acontece sempre.
O Tratado da Nova Fronteira que substituiu o antigo de Genebra, nos mantém seguros, impedindo-os de chegarem mais perto e evitando assim envolver ou provocar baixas em civis. Mas mesmo longe às vezes consigo ver o que poderia ser alguma explosão, que embora lá de cima possam ser assustadoras, daqui parecem mais pequenos flashes, como de um show pirotécnico.
Há uma antiga lenda que diz que, se fecharmos os olhos ao depararmos com uma estrela cadente e fazer um desejo, ele poderia se realizar. É estranha a maneira que o mundo me exclui de seu meio, pois tenho que desejar primeiro ver uma estrela, para depois poder formatar um desejo e, infelizmente, esta dádiva nunca me foi concedida.
Dizem que quando desejamos muito algo, o universo conspira em nosso favor. E talvez haja um fundo de verdade nisso, pois de tanto desejar ver um corpo celeste em cadência, eis que ele surge tão próximo, que nenhum olho humano pode presenciar em toda história.
Sei que as estrelas cadentes se desintegram ao passarem para a atmosfera, mas a minha em especial não foi detida por nossa camada protetora. E nem veio da radiante como costuma ser, mas de um dos pequenos focos de explosões que consegui ver mesmo estando a olho nu, riscando todo o céu e caindo no lago bem próximo de mim.
Talvez a maneira que chocou-se com a água, tenha aliviado seu impacto – vindo do lado oposto em que eu estava, atravessando o lago por completo, só parando há alguns metros já na parte rasa – e o que tive tão perto, não foi um pedaço de meteorito, mas sim uma espécie de nave espacial, que o piloto teve a perícia de fazer uma curva ascendente antes de se chocar com a água e, apesar dos muitos destroços incandescentes, a parte principal ou melhor, o cockpit ainda permanecia intacto, sofrendo poucas avarias.
Meu instinto foi o mesmo que vários seres humanos fariam: Tentar retirar o piloto do cockpit antes que ocorresse alguma explosão. Não quis arriscar mesmo sabendo que o sistema de segurança refrigeraria as partes que pudessem sofrer combustão e, mesmo sem saber de início se ele era um dos aliados, lá estava eu usando toda a força que havia adquirido cuidando da lavoura, para tirar o corpo desacordo de dentro de sua nave.
Sim. Era uma “Defênder”. Daquelas usadas para retardar os ataques inimigos e facilitar a fuga dos aliados. Mas parece que nosso amigo aqui não conseguiu sucesso em sua própria fuga. O Tratado da Nova Fronteira não permite que pilotos persigam ou alvejem o inimigo em solo após sua nave ser abatida e talvez por isso, praticamente ninguém veio atrás dele quando caiu, nem mesmo aliados. Deviam ter problemas maiores para enfrentar lá em cima.
Assim sem ser incomodada, consegui com muito esforço levar o piloto para dentro de casa e o acomodei em minha cama. Parecia em coma, mas respirava sem problemas.
Em seu pescoço, havia um colar de guerra, usado sempre em combate e servem para identificação em caso de mutilações. O seu possuía uma luz piscante, que parecia emitir algum sinal. Fiquei com medo que os inimigos também rastreassem este sinal e viessem em sua captura e achei por melhor desativá-lo. Sei que na hora que acordasse, ele saberia melhor o que fazer. Ao tirar sua roupa, fiquei impressionada pela beleza do que estava diante de mim.
O piloto era alto, de corpo robusto e bem torneado, mas com cabelos loiros e rosto delicado, lembrando-se a um Deus grego. Era belo, uma beleza que jamais teria diante de mim. Daqueles que fora feito para as garotas mais abastadas. O tipo de gente que o Pai Maior pareceu amar mais que as outras e lhe dar os melhores atributos físicos.
Cuidei com um amor materno e felino de seus ferimentos e limpei seu corpo com pano molhado em água quente, pois não possuía força suficiente para locomovê-lo até a área de banho. Durante o resto da noite, ele parecia sofrer convulsões e ter pesadelos, mas jamais abriu os olhos. Fiquei acordada até o raiar do dia esperando que alguma equipe de resgate viesse buscá-lo, o que não ocorreu. Durante este tempo, não sabia se sentia pena pelo seu infortúnio, ou admiração por sua beleza.
Estava por perto quando ele abriu os olhos. Sei que Deus nos tira do corpo frações de segundos antes de algum desastre e em alguns casos nos devolve depois, evitando assim algum trauma. Mas neste caso, sua amnésia parecia ser muito maior e o que vi mais parecia uma criança recém nascida, ou animal qualquer. Que confia sua vida e pega afeição pelo primeiro ser que vê na frente. E como uma criança precisando de carinho, ele apenas me abraçou e encostou sua cabeça em meu peito.
Esperei por instantes que ele falasse, mas ele parecia não saber se comunicar. Tomei-o pelas mãos e o ajudei a se vestir. Em seguida levei-o até próximo à sua nave, mas ele parecia não só não reconhecê-la, mas era totalmente indiferente a ela. Sequer parecia saber o que era aquele objeto.
Tentando auxiliar em sua lembrança, retirei da nave alguns objetos pessoais e os apresentei, mas ele os tomava em mãos e os deixava cair. Era como se não significassem nada em sua vida, ao contrário, o guerreiro parecia mais um ser dependente de minha pessoa, como um filhote por seu genitor e assim me seguia por onde quer que fosse, sempre procurando segurar uma de minhas mãos.
Confesso que jamais recebi tal forma de carinho e isso me fez cometer uma espécie de delito: O de não acionar o Alinhador de Neurônios, que estava entre seus objetos pessoais e que gera sinais que alinham e tentam de certa forma “reiniciar” a memória semântica. Isso poderia incentivar a recuperação de toda ou boa parte de sua memória, mas tenho medo destes sistemas artificiais e dos danos celebrais que possam causar. Preferí de certa forma, incentivar suas lembranças com ações e lhe mostrando mais objetos pessoais, como fotografias encontradas no cockpit de sua nave.
Os dias passavam e ele parecia indiferente. Parecia não se importar com sua outrora vida, ou parentes expostos em tais gravuras. Preocupava-se apenas em ficar ao meu lado, me seguindo o dia todo e ajudando nas tarefas diárias.Até mesmo na hora de comer, abandonava seu prato e só se alimentava do que estivesse no meu.
Comecei a criar o guerreiro como um filho, embora o desejasse como marido. Sabia que a recuperação de sua memória seria questão de tempo e ele logo me deixaria, mas o mutuo sentimento de amor e afeto parecia apenas aumentar com o passar dos dias.
Costurei sua farda e fui até a cidade comprar mais algumas roupas. O tempo todo ele se postava ao meu lado e sempre de mãos dadas. Desde o dia em que chegou, não pronunciou uma só palavra e cheguei a argumentar com uma vendedora que ele (o meu marido) sofria de problemas mentais e não sabia se comunicar.
Pela primeira vez na vida, enquanto caminhava pelas ruas do centro, pude sentir orgulho ao ver outras garotas admirarem meu homem e saber que ele queria apenas estar ao meu lado.
De nada adiantou a educação moral com que fui criada dentro do berço familiar. Evitei confesso, dormir ao seu lado, pois o desejava. Mas sempre que o deixava sozinho na cama e ia me deitar no sofá, acordava com ele tentando se postar ao meu lado.
Houve uma vez em que ele dormiu ao solo apenas para ficar do meu lado e isso me comoveu. Por saber que se tratava de um adulto, resolvi dividir com ele a mesma cama, mas evitei ao máximo tocá-lo. As sempre que me virava para o canto, ele me abraçava por trás.
Numa dessas noites, senti seu membro rígido encostando-se a mim e a excitação dominou minha parte pensante. Após várias tentativas em vão de pegar no sono, pus-me sobre ele e o fiz me penetrar.
Confesso que nunca fiquei tão excitada em minha vida, tão pouco senti tanto prazer a cada vez que esfregava meu corpo com seu. Mas como um garoto que não sabia o que estava fazendo, tive que induzi-lo com minhas mãos a tocar meu seio.
Ao acordar no dia seguinte, não sabia se sentia vergonha ou alegria pela noite anterior. Sentei-me na cama e coloquei as mãos no rosto e a primeira coisa que ele fez ao acordar, foi me abraçar. Agora eu possuía um filho e marido...
Nos amamos todas as noites a seguir e também durante o dia. A vida isolada permitia de certa forma que não sofresse qualquer forma de constrangimento, quando ele – sim, agora ele – me procurava mesmo durante as tarefas.
A alegria de ter alguém por perto (filho e marido) que realmente me amava me trouxe de volta a vida. Assim sempre procurava exibir-lhe e ensinar várias coisas, desde os pássaros até manusear alguns instrumentos da agricultura doméstica. Sempre fora dedicado em aprender e só parava com uma tarefa quando eu ordenasse.
O fato de querer voltar ao meio da civilização fez com que cometesse meu maior erro – ou acerto.
Após um dia cansativo e de tarefas árduas, comecei a ver televisão novamente, sempre lhe mostrando os desenhos e atores de dramatização. Mas fora na hora do noticiário, que senti um frio na espinha e minhas pernas vacilaram.
Numa das reportagens, uma mulher com duas crianças implorava por notícias de um piloto, que parecia ter desaparecido em combate. Que era um piloto de Defender, incumbido de dar proteção aos que precisavam bater em retirada, mas que parecia ter sido abatido em sua nobre missão.
Pelo nível de altura do teatro de ações, se sua nave tivesse caído, poderia estar em qualquer estado ou país latino, mas não possuíam notícias porque seu colar sinalizador havia deixado de operar.
Preparavam um enterro simbólico, com todas as honrarias, mas a mulher parecia não aceitar, pois sentia que o marido estava vivo e acreditava que cedo ou tarde, ele iria voltar ao lar.
Reconheci a mulher e as crianças, eram as mesmas das fotografias encontradas na nave. Sua esposa e filhos queriam seu ente querido de volta...
Meu parceiro assistiu as cenas com apatia. Não existia qualquer vestígio ali de que um dia fizera parte daquela família e vendo-o assim com aquela indiferença, pude notar a injustiça que estava cometendo.
Desliguei a TV e me deitei com ele evitando as lágrimas. Assim que ele adormeceu, fui para fora e sentei-me no lugar onde o tinha visto pela primeira vez, em baixo do pé de seringuela.
Olhei para o céu, limpo e estrelado. Não parecia haver mais batalhas, aliás, estive tão entretida com ele nos últimos dias, que nem ligava mais em contemplar o céu.
Por que o Pai Maior age assim com a gente? Por que para a minha felicidade, outra pessoa semelhante teria que sofrer?
Pai o senhor é injusto! Deste-me algo e agora me tiras quando mais preciso dele? Tomaste-me sem compaixão e de uma só vez o esposo e filho, as duas piores perdas que uma mulher pode suportar... Por que deste-me uma estrela cadente, mesmo sabendo que ela nunca seria minha de verdade?
E naquela noite eu chorei. Chorei por minha vida e por todos que conheci. Por não ter tido um amor de verdade e estar de certa forma tomando o amor de alguém. Porque Deus me fez para isso: Viver às margens, servir aos outros, os ver serem felizes e não poder compartilhar desta felicidade...
Sempre que as lágrimas cessavam, a lembrança de minha estrela, que agora seria ascendente, fazia brotar mais e o vazio de minha alma sufocava meus sentimentos, os sugando como um buraco negro.
Quisera eu estar dentro daquela nave quando caiu. Para morrer ou então como minha estrela, apagar da mente todo um passado de frustrações amorosas.
Quando glândulas lacrimais pareciam não possuir mais emoções para exporem, fui para casa e o contemplei dormindo pela última vez. Aproveitando seu sono pesado, devido a exaustão de um dia de trabalho, fui até a estante e peguei o Alinhador de Neurônios e o acionei. Uma pequena luz começou a piscar e o coloquei no criado mudo, do seu lado da cama com a pequena lâmpada apontada em sua direção.
Entrei sob o lençol e fiquei de costas para ele. Mesmo estando dormindo, pude notá-lo se “arrastando” na cama e me envolvendo com um de seus braços.
Por causa da tristeza e das lágrimas, custei a pegar no sono, o que fez com que no dia seguinte, acordasse mais tarde. Nquele instante, ao meu lado minha estrela postava-se em pé, ajustando ao corpo, a farda que lhe havia costurado. Olhou-me com indiferença, acionou o colar em seu pescoço e foi para fora.
Fiquei alguns por segundos sentada na cama, sentindo um misto de vergonha e tristeza, até tomar coragem de ir atrás dele.
De costas para mim ele falou, como se quisesse evitar minha aproximação:
– Por ter de certa forma salvo a minha vida e cuidado de mim, não relatarei o abuso sexual...
Voltei para dentro e me joguei na cama chorando. Horas depois ouvi sons fortes de turbinas se aproximarem. Saí e vi várias naves aterrissando em quintal e vários militares descerem em suas plataformas.
Um homem, que parecia ser o superior dos demais veio ao seu encontro, prestou-lhe continência e lhe deu um breve abraço.
Enquanto as outras naves decolavam, este homem veio até mim:
– Você é um orgulho para a nossa espécie! E por pessoas como você que ainda acreditamos nesta batalha! Receberá suas honrarias...
– Obrigada... Prefiro não receber... – dei-lhe as costas evitando exibir-lhe a lágrima deslizava em meu rosto –... prefiro ficar sozinha por aqui como sempre foi...
Ouvi o som das turbinas se acelerando e a voz do comandante ao entrar em sua nave:
– Heróis anônimos... São desses que o mundo precisa...
E assim como veio, minha estrela me deixou. Destrui minha TV, pois não queria ver a notícia dele voltando ao lar e jurei nunca mais me entreter com qualquer outro meio de comunicação.
A todos assumo este meu crime de cárcere privado e abuso sexual, porém deixo este relato de tristeza, de um sonho que acabou antes mesmo de começar...
Vá com Deus meu anjo celeste! Que Ele o guie e que jamais se volte a ser uma estrela cadente! Vá proteger quem mais precisa de você!
Eu guardo um pouquinho de você aqui dentro de mim...
Para quem gostaria de conhecer a versão original, posto-a aqui agora:
A Estrela Cadente
Por que a felicidade chega sem avisar e da mesma maneira nos deixa? Infelizmente, lampejos de tristeza nos marcam mais que os de alegria e é esta história que conto-lhes agora...
Não saberia dizer que parte mais falta em mim. Que ingrediente fora dosado de maneira incorreta, não causando a tão desejada “química” com os outros de meu meio.
Sou uma pessoa considerada “dispensável”. Daquelas que ninguém sente a falta caso você não vá à uma festa. Que chega a atrair amigos, mas logo eles parecem se enjoar e sem breve aviso, simplesmente te abandonam.
Não! Não sou uma pessoa feia, mas também não me acho encantadora. Creio faltar aquele ingrediente para o bolo, a cereja para dar charme, seja ela um penteado, ou mesmo a maneira correta de se vestir.
Talvez o fato de ter passado toda a minha infância na zona rural tenha-me feito uma genuína cabocla, que não conseguiu se adaptar aos novos amigos da cidade e, por mais que me esforçasse, jamais consegui tornar-me elegante mesmo comprando roupas sofisticadas, que pareciam nunca combinar com meu corpo.
Evitando me tornar um exemplo real de como a realidade imita a ficção e não trazer à vida a personagem ridicularizada por amigos nos filmes americanos, voltei às origens e hoje vivo isolada aqui, no sítio que era da família.
Confesso que já tive meus amores e desejos, mas nenhum deles correspondeu. Entreguei inclusive minha virgindade a alguém que pouco caso fez assim que a conquistou mesmo sendo após muita insistência.
Acho que o problema não são os outros, mas talvez eu mesma, ou até mesmo minha existência. Sendo assim, isolo-me neste meu pequeno mundo e em plena era espacial, evito ligar a televisão, ou qualquer meio de comunicação com o mundo externo, para evitar possíveis arrependimentos de uma vida há muito tempo deixada para trás. Assim sendo, minha melhor companhia são minhas criações e plantas.
Todas as noites, como em um ritual usado por milhões de pessoas no horário nobre em frente seus aparelhos de TV, sento-me sob o pé de seringuela próximo ao lago e de lá fico contemplando o céu, pois nenhuma tela digital por maior e moderna que seja, conseguirá fazer surtir o efeito do espaço mestre.
Sei que lá em cima a batalha continua, sendo perceptível a olho nu apenas durante a noite e quando estes conflitos ocorrem muito perto, o que não acontece sempre.
O Tratado da Nova Fronteira que substituiu o antigo de Genebra, nos mantém seguros, impedindo-os de chegarem mais perto e evitando assim envolver ou provocar baixas em civis. Mas mesmo longe às vezes consigo ver o que poderia ser alguma explosão, que embora lá de cima possam ser assustadoras, daqui parecem mais pequenos flashes, como de um show pirotécnico.
Há uma antiga lenda que diz que, se fecharmos os olhos ao depararmos com uma estrela cadente e fazer um desejo, ele poderia se realizar. É estranha a maneira que o mundo me exclui de seu meio, pois tenho que desejar primeiro ver uma estrela, para depois poder formatar um desejo e, infelizmente, esta dádiva nunca me foi concedida.
Dizem que quando desejamos muito algo, o universo conspira em nosso favor. E talvez haja um fundo de verdade nisso, pois de tanto desejar ver um corpo celeste em cadência, eis que ele surge tão próximo, que nenhum olho humano pode presenciar em toda história.
Sei que as estrelas cadentes se desintegram ao passarem para a atmosfera, mas a minha em especial não foi detida por nossa camada protetora. E nem veio da radiante como costuma ser, mas de um dos pequenos focos de explosões que consegui ver mesmo estando a olho nu, riscando todo o céu e caindo no lago bem próximo de mim.
Talvez a maneira que chocou-se com a água, tenha aliviado seu impacto – vindo do lado oposto em que eu estava, atravessando o lago por completo, só parando há alguns metros já na parte rasa – e o que tive tão perto, não foi um pedaço de meteorito, mas sim uma espécie de nave espacial, que o piloto teve a perícia de fazer uma curva ascendente antes de se chocar com a água e, apesar dos muitos destroços incandescentes, a parte principal ou melhor, o cockpit ainda permanecia intacto, sofrendo poucas avarias.
Meu instinto foi o mesmo que vários seres humanos fariam: Tentar retirar o piloto do cockpit antes que ocorresse alguma explosão. Não quis arriscar mesmo sabendo que o sistema de segurança refrigeraria as partes que pudessem sofrer combustão e, mesmo sem saber de início se ele era um dos aliados, lá estava eu usando toda a força que havia adquirido cuidando da lavoura, para tirar o corpo desacordo de dentro de sua nave.
Sim. Era uma “Defênder”. Daquelas usadas para retardar os ataques inimigos e facilitar a fuga dos aliados. Mas parece que nosso amigo aqui não conseguiu sucesso em sua própria fuga. O Tratado da Nova Fronteira não permite que pilotos persigam ou alvejem o inimigo em solo após sua nave ser abatida e talvez por isso, praticamente ninguém veio atrás dele quando caiu, nem mesmo aliados. Deviam ter problemas maiores para enfrentar lá em cima.
Assim sem ser incomodada, consegui com muito esforço levar o piloto para dentro de casa e o acomodei em minha cama. Parecia em coma, mas respirava sem problemas.
Em seu pescoço, havia um colar de guerra, usado sempre em combate e servem para identificação em caso de mutilações. O seu possuía uma luz piscante, que parecia emitir algum sinal. Fiquei com medo que os inimigos também rastreassem este sinal e viessem em sua captura e achei por melhor desativá-lo. Sei que na hora que acordasse, ele saberia melhor o que fazer. Ao tirar sua roupa, fiquei impressionada pela beleza do que estava diante de mim.
O piloto era alto, de corpo robusto e bem torneado, mas com cabelos loiros e rosto delicado, lembrando-se a um Deus grego. Era belo, uma beleza que jamais teria diante de mim. Daqueles que fora feito para as garotas mais abastadas. O tipo de gente que o Pai Maior pareceu amar mais que as outras e lhe dar os melhores atributos físicos.
Cuidei com um amor materno e felino de seus ferimentos e limpei seu corpo com pano molhado em água quente, pois não possuía força suficiente para locomovê-lo até a área de banho. Durante o resto da noite, ele parecia sofrer convulsões e ter pesadelos, mas jamais abriu os olhos. Fiquei acordada até o raiar do dia esperando que alguma equipe de resgate viesse buscá-lo, o que não ocorreu. Durante este tempo, não sabia se sentia pena pelo seu infortúnio, ou admiração por sua beleza.
Estava por perto quando ele abriu os olhos. Sei que Deus nos tira do corpo frações de segundos antes de algum desastre e em alguns casos nos devolve depois, evitando assim algum trauma. Mas neste caso, sua amnésia parecia ser muito maior e o que vi mais parecia uma criança recém nascida, ou animal qualquer. Que confia sua vida e pega afeição pelo primeiro ser que vê na frente. E como uma criança precisando de carinho, ele apenas me abraçou e encostou sua cabeça em meu peito.
Esperei por instantes que ele falasse, mas ele parecia não saber se comunicar. Tomei-o pelas mãos e o ajudei a se vestir. Em seguida levei-o até próximo à sua nave, mas ele parecia não só não reconhecê-la, mas era totalmente indiferente a ela. Sequer parecia saber o que era aquele objeto.
Tentando auxiliar em sua lembrança, retirei da nave alguns objetos pessoais e os apresentei, mas ele os tomava em mãos e os deixava cair. Era como se não significassem nada em sua vida, ao contrário, o guerreiro parecia mais um ser dependente de minha pessoa, como um filhote por seu genitor e assim me seguia por onde quer que fosse, sempre procurando segurar uma de minhas mãos.
Confesso que jamais recebi tal forma de carinho e isso me fez cometer uma espécie de delito: O de não acionar o Alinhador de Neurônios, que estava entre seus objetos pessoais e que gera sinais que alinham e tentam de certa forma “reiniciar” a memória semântica. Isso poderia incentivar a recuperação de toda ou boa parte de sua memória, mas tenho medo destes sistemas artificiais e dos danos celebrais que possam causar. Preferí de certa forma, incentivar suas lembranças com ações e lhe mostrando mais objetos pessoais, como fotografias encontradas no cockpit de sua nave.
Os dias passavam e ele parecia indiferente. Parecia não se importar com sua outrora vida, ou parentes expostos em tais gravuras. Preocupava-se apenas em ficar ao meu lado, me seguindo o dia todo e ajudando nas tarefas diárias.Até mesmo na hora de comer, abandonava seu prato e só se alimentava do que estivesse no meu.
Comecei a criar o guerreiro como um filho, embora o desejasse como marido. Sabia que a recuperação de sua memória seria questão de tempo e ele logo me deixaria, mas o mutuo sentimento de amor e afeto parecia apenas aumentar com o passar dos dias.
Costurei sua farda e fui até a cidade comprar mais algumas roupas. O tempo todo ele se postava ao meu lado e sempre de mãos dadas. Desde o dia em que chegou, não pronunciou uma só palavra e cheguei a argumentar com uma vendedora que ele (o meu marido) sofria de problemas mentais e não sabia se comunicar.
Pela primeira vez na vida, enquanto caminhava pelas ruas do centro, pude sentir orgulho ao ver outras garotas admirarem meu homem e saber que ele queria apenas estar ao meu lado.
De nada adiantou a educação moral com que fui criada dentro do berço familiar. Evitei confesso, dormir ao seu lado, pois o desejava. Mas sempre que o deixava sozinho na cama e ia me deitar no sofá, acordava com ele tentando se postar ao meu lado.
Houve uma vez em que ele dormiu ao solo apenas para ficar do meu lado e isso me comoveu. Por saber que se tratava de um adulto, resolvi dividir com ele a mesma cama, mas evitei ao máximo tocá-lo. As sempre que me virava para o canto, ele me abraçava por trás.
Numa dessas noites, senti seu membro rígido encostando-se a mim e a excitação dominou minha parte pensante. Após várias tentativas em vão de pegar no sono, pus-me sobre ele e o fiz me penetrar.
Confesso que nunca fiquei tão excitada em minha vida, tão pouco senti tanto prazer a cada vez que esfregava meu corpo com seu. Mas como um garoto que não sabia o que estava fazendo, tive que induzi-lo com minhas mãos a tocar meu seio.
Ao acordar no dia seguinte, não sabia se sentia vergonha ou alegria pela noite anterior. Sentei-me na cama e coloquei as mãos no rosto e a primeira coisa que ele fez ao acordar, foi me abraçar. Agora eu possuía um filho e marido...
Nos amamos todas as noites a seguir e também durante o dia. A vida isolada permitia de certa forma que não sofresse qualquer forma de constrangimento, quando ele – sim, agora ele – me procurava mesmo durante as tarefas.
A alegria de ter alguém por perto (filho e marido) que realmente me amava me trouxe de volta a vida. Assim sempre procurava exibir-lhe e ensinar várias coisas, desde os pássaros até manusear alguns instrumentos da agricultura doméstica. Sempre fora dedicado em aprender e só parava com uma tarefa quando eu ordenasse.
O fato de querer voltar ao meio da civilização fez com que cometesse meu maior erro – ou acerto.
Após um dia cansativo e de tarefas árduas, comecei a ver televisão novamente, sempre lhe mostrando os desenhos e atores de dramatização. Mas fora na hora do noticiário, que senti um frio na espinha e minhas pernas vacilaram.
Numa das reportagens, uma mulher com duas crianças implorava por notícias de um piloto, que parecia ter desaparecido em combate. Que era um piloto de Defender, incumbido de dar proteção aos que precisavam bater em retirada, mas que parecia ter sido abatido em sua nobre missão.
Pelo nível de altura do teatro de ações, se sua nave tivesse caído, poderia estar em qualquer estado ou país latino, mas não possuíam notícias porque seu colar sinalizador havia deixado de operar.
Preparavam um enterro simbólico, com todas as honrarias, mas a mulher parecia não aceitar, pois sentia que o marido estava vivo e acreditava que cedo ou tarde, ele iria voltar ao lar.
Reconheci a mulher e as crianças, eram as mesmas das fotografias encontradas na nave. Sua esposa e filhos queriam seu ente querido de volta...
Meu parceiro assistiu as cenas com apatia. Não existia qualquer vestígio ali de que um dia fizera parte daquela família e vendo-o assim com aquela indiferença, pude notar a injustiça que estava cometendo.
Desliguei a TV e me deitei com ele evitando as lágrimas. Assim que ele adormeceu, fui para fora e sentei-me no lugar onde o tinha visto pela primeira vez, em baixo do pé de seringuela.
Olhei para o céu, limpo e estrelado. Não parecia haver mais batalhas, aliás, estive tão entretida com ele nos últimos dias, que nem ligava mais em contemplar o céu.
Por que o Pai Maior age assim com a gente? Por que para a minha felicidade, outra pessoa semelhante teria que sofrer?
Pai o senhor é injusto! Deste-me algo e agora me tiras quando mais preciso dele? Tomaste-me sem compaixão e de uma só vez o esposo e filho, as duas piores perdas que uma mulher pode suportar... Por que deste-me uma estrela cadente, mesmo sabendo que ela nunca seria minha de verdade?
E naquela noite eu chorei. Chorei por minha vida e por todos que conheci. Por não ter tido um amor de verdade e estar de certa forma tomando o amor de alguém. Porque Deus me fez para isso: Viver às margens, servir aos outros, os ver serem felizes e não poder compartilhar desta felicidade...
Sempre que as lágrimas cessavam, a lembrança de minha estrela, que agora seria ascendente, fazia brotar mais e o vazio de minha alma sufocava meus sentimentos, os sugando como um buraco negro.
Quisera eu estar dentro daquela nave quando caiu. Para morrer ou então como minha estrela, apagar da mente todo um passado de frustrações amorosas.
Quando glândulas lacrimais pareciam não possuir mais emoções para exporem, fui para casa e o contemplei dormindo pela última vez. Aproveitando seu sono pesado, devido a exaustão de um dia de trabalho, fui até a estante e peguei o Alinhador de Neurônios e o acionei. Uma pequena luz começou a piscar e o coloquei no criado mudo, do seu lado da cama com a pequena lâmpada apontada em sua direção.
Entrei sob o lençol e fiquei de costas para ele. Mesmo estando dormindo, pude notá-lo se “arrastando” na cama e me envolvendo com um de seus braços.
Por causa da tristeza e das lágrimas, custei a pegar no sono, o que fez com que no dia seguinte, acordasse mais tarde. Nquele instante, ao meu lado minha estrela postava-se em pé, ajustando ao corpo, a farda que lhe havia costurado. Olhou-me com indiferença, acionou o colar em seu pescoço e foi para fora.
Fiquei alguns por segundos sentada na cama, sentindo um misto de vergonha e tristeza, até tomar coragem de ir atrás dele.
De costas para mim ele falou, como se quisesse evitar minha aproximação:
– Por ter de certa forma salvo a minha vida e cuidado de mim, não relatarei o abuso sexual...
Voltei para dentro e me joguei na cama chorando. Horas depois ouvi sons fortes de turbinas se aproximarem. Saí e vi várias naves aterrissando em quintal e vários militares descerem em suas plataformas.
Um homem, que parecia ser o superior dos demais veio ao seu encontro, prestou-lhe continência e lhe deu um breve abraço.
Enquanto as outras naves decolavam, este homem veio até mim:
– Você é um orgulho para a nossa espécie! E por pessoas como você que ainda acreditamos nesta batalha! Receberá suas honrarias...
– Obrigada... Prefiro não receber... – dei-lhe as costas evitando exibir-lhe a lágrima deslizava em meu rosto –... prefiro ficar sozinha por aqui como sempre foi...
Ouvi o som das turbinas se acelerando e a voz do comandante ao entrar em sua nave:
– Heróis anônimos... São desses que o mundo precisa...
E assim como veio, minha estrela me deixou. Destrui minha TV, pois não queria ver a notícia dele voltando ao lar e jurei nunca mais me entreter com qualquer outro meio de comunicação.
A todos assumo este meu crime de cárcere privado e abuso sexual, porém deixo este relato de tristeza, de um sonho que acabou antes mesmo de começar...
Vá com Deus meu anjo celeste! Que Ele o guie e que jamais se volte a ser uma estrela cadente! Vá proteger quem mais precisa de você!
Eu guardo um pouquinho de você aqui dentro de mim...
terça-feira, 8 de dezembro de 2009
Solarium 2 – Contos de Ficção Científica
A editora Multifoco lança em primeira mão a seqüência de sua Antologia com o tema Ficção Científica.
Solarium 2 chega com melhorias cruciais em relação a primeira, com acréscimo de elementos que a torna mais atraente visualmente, como ilustrações criadas por James Fox; e esteticamente como a própria capa.
Dos autores que participaram da primeira edição, Emanoel Ferreira, Frodo Oliveira, José Geraldo Gouvêa, Humberto Amaral e Ronaldo Luiz Souza garantiram presença. Completam o time Alex Lopes, Bia machado, Bruno Borges, Cássio Michelon, Cátia Cernov, Daniel Lima, Duda Falcão, Fillipe Jardim, Frank Bacural, Henrique Weizenmann, Igor Silva, J.Fox e Misael Archanjo, J.Miguel, Jorge Eduardo Magalhães, Lauro Wink, Luiz de Souza, Luiz Mendes Jr, Matheus A. Quinan e Rubem Cabral.
Além da evolução visual, os textos também estão mais "polidos" e a apresentação da biografia de seus autores ao final de seus respectivos contos foi uma boa sacada, pois dá ao leitor um canal direto com o autor sem precisar mudar a página.
Solarium 2 mostra mais uma etapa da pioneira e exclusiva iniciativa da Editora Multifoco em investir no talento nacional. Alguns desses autores já possuem livros solos publicados e o reconhecimento será questão de tempo. Mais uma oportunidade de conhecer o trabalho dos novos autores do Brasil, neste caso ambientado no gênero Ficção Científica, que tanto carece de novo fôlego no âmbito nacional.
Quem quiser conferir mais este trabalho, o site da editora é http://www.editoramultifoco.com.br/catalogo2.asp?lv=186 direto ao livro.
Para conhecer o trabalho da editora, visite http://www.editoramultifoco.com.br/index.asp
Comunidade Solarium no Orkut, um canal direto com seus autores:
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quarta-feira, 14 de outubro de 2009
É o fim cara!
Trecho de "As Crônicas de Valdo"
Pobre Igor!... Também, quem mandou ir trabalhar logo com Pedroso – o Ascoso? Contudo sua lamúria iria deixar de ser um jargão pessoal para se tornar um bordão profissional.
Bastava algo não ocorrer da maneira esperada para a sirene melancólica soar partindo o coração mais caridoso:
– O pagamento veio pouco...
– É o fim cara!...
– Teremos que trabalhar no feriado...
– É o fim cara!...
– O frio está de matar...
– É o fim cara!...
Fim de festa, de feira, de carreira, não importava. Pedroso, o ascoso tornaria o dia do pobre Igor o pior a cada jornada. Seu talento nato viria dos primórdios da infância, desde inocentes retiradas de tatu do nariz para colar sob a carteira, até roçar o traseiro de mulheres em ônibus lotados na adolescência.
Apesar de a fase adulta lhe proporcionar novas experiências, ainda guarda velhos hábitos em nome da tradição. Então caro leitor, não se surpreenda se o vir por aí ainda tirando tatu, agora com nova ferramenta – a unha do dedo mínimo, que deixa crescer até alcançar o anular, geralmente em rodas de bar onde seu assunto predileto são os dotes de esposas alheias.
Execrável! Rabeira da humanidade. O tempo passa, seu ego fica.
Exclua-se Pedroso. Jamais o Ascoso.
Na era digital, seria famoso em redes virtuais por filmar genitálias femininas com aparelho celular oculto em locais de grande fluxo para exibir para semblantes em repulsa. Na vida real, sua miopia mental o impede de reconhecer o avanço da idade, e o excesso de botox mental não deixou espaço para a sabedoria, achando-se galanteador nível adolescente e sufocando de aversão as que abandonaram a fase colorida da vida.
A beleza do brinco foi oculta pelas rugas e os cílios grisalhos que lhe saltam pelas grutas nasais, impedem-lhe o olfato, sendo quase obrigado a encostar o órgão em seu alvo.
Alimentar-se ao seu lado era uma experiência inesquecível, de frente antológica.
No café, era o pingado que se misturava ao bigode, no almoço era sua mandíbula mastigando com a boca aberta – girando em sentido horário e sua ponte móvel em outro.
Tornou-se especialista em se aproximar das pessoas na hora das refeições, pois todos queriam sentar-se ao seu lado, evitando tornarem-se expectadores de sua ponte dançando brake misturada a pasta de arroz.
Memorável sua procura dentro da cumbuca de feijão, após queda acidental e feliz sua esposa que durante um cochilo ao sofá, a colocava de volta em sua boca.
Agora formava uma dupla de sucesso com Igor. Sucesso desses que muda a vida do astro e o torna infeliz. O dinheiro não é tudo, nem mesmo as metas de vendas. Mas sua ausência ao fim de um dia de trabalho costuma provocar excessos de fúria em superiores:
– Foi mal de novo Igor?
– É o fim cara!...
– Cadê o ascoso?
– Está lá sentado no colo do homem...
Ou o sinal de falta de perspectivas:
– Desanimado Igor?
– É o fim cara!...
– O que foi desta vez?
– A cada cliente é um café e três cigarros. E sou eu quem tem a obrigação de limpar o carro.
De torcicolo indiagnosticável, incapaz de apreciar a beleza feminina de relance, tendo de se postar sobre elas.
Sua rédea eqüina com tapa de mula, o impede de ver sua crina, mas não a cauda alheia. De humor controverso, acha graça onde não há graça e é arisca o suficiente para açoitar em coice os menos avisados.
Um breve e singelo retrato de alguém que insiste em ser presente em alguém que deveria emigrar do passado.
O superior chama, Igor desistiu da vida e não mais servirá a empresa.
Eu serei seu substituto...
É o fim cara!...
trecho de "As Crônicas de Valdo"
Pobre Igor!... Também, quem mandou ir trabalhar logo com Pedroso – o Ascoso? Contudo sua lamúria iria deixar de ser um jargão pessoal para se tornar um bordão profissional.
Bastava algo não ocorrer da maneira esperada para a sirene melancólica soar partindo o coração mais caridoso:
– O pagamento veio pouco...
– É o fim cara!...
– Teremos que trabalhar no feriado...
– É o fim cara!...
– O frio está de matar...
– É o fim cara!...
Fim de festa, de feira, de carreira, não importava. Pedroso, o ascoso tornaria o dia do pobre Igor o pior a cada jornada. Seu talento nato viria dos primórdios da infância, desde inocentes retiradas de tatu do nariz para colar sob a carteira, até roçar o traseiro de mulheres em ônibus lotados na adolescência.
Apesar de a fase adulta lhe proporcionar novas experiências, ainda guarda velhos hábitos em nome da tradição. Então caro leitor, não se surpreenda se o vir por aí ainda tirando tatu, agora com nova ferramenta – a unha do dedo mínimo, que deixa crescer até alcançar o anular, geralmente em rodas de bar onde seu assunto predileto são os dotes de esposas alheias.
Execrável! Rabeira da humanidade. O tempo passa, seu ego fica.
Exclua-se Pedroso. Jamais o Ascoso.
Na era digital, seria famoso em redes virtuais por filmar genitálias femininas com aparelho celular oculto em locais de grande fluxo para exibir para semblantes em repulsa. Na vida real, sua miopia mental o impede de reconhecer o avanço da idade, e o excesso de botox mental não deixou espaço para a sabedoria, achando-se galanteador nível adolescente e sufocando de aversão as que abandonaram a fase colorida da vida.
A beleza do brinco foi oculta pelas rugas e os cílios grisalhos que lhe saltam pelas grutas nasais, impedem-lhe o olfato, sendo quase obrigado a encostar o órgão em seu alvo.
Alimentar-se ao seu lado era uma experiência inesquecível, de frente antológica.
No café, era o pingado que se misturava ao bigode, no almoço era sua mandíbula mastigando com a boca aberta – girando em sentido horário e sua ponte móvel em outro.
Tornou-se especialista em se aproximar das pessoas na hora das refeições, pois todos queriam sentar-se ao seu lado, evitando tornarem-se expectadores de sua ponte dançando brake misturada a pasta de arroz.
Memorável sua procura dentro da cumbuca de feijão, após queda acidental e feliz sua esposa que durante um cochilo ao sofá, a colocava de volta em sua boca.
Agora formava uma dupla de sucesso com Igor. Sucesso desses que muda a vida do astro e o torna infeliz. O dinheiro não é tudo, nem mesmo as metas de vendas. Mas sua ausência ao fim de um dia de trabalho costuma provocar excessos de fúria em superiores:
– Foi mal de novo Igor?
– É o fim cara!...
– Cadê o ascoso?
– Está lá sentado no colo do homem...
Ou o sinal de falta de perspectivas:
– Desanimado Igor?
– É o fim cara!...
– O que foi desta vez?
– A cada cliente é um café e três cigarros. E sou eu quem tem a obrigação de limpar o carro.
De torcicolo indiagnosticável, incapaz de apreciar a beleza feminina de relance, tendo de se postar sobre elas.
Sua rédea eqüina com tapa de mula, o impede de ver sua crina, mas não a cauda alheia. De humor controverso, acha graça onde não há graça e é arisca o suficiente para açoitar em coice os menos avisados.
Um breve e singelo retrato de alguém que insiste em ser presente em alguém que deveria emigrar do passado.
O superior chama, Igor desistiu da vida e não mais servirá a empresa.
Eu serei seu substituto...
É o fim cara!...
trecho de "As Crônicas de Valdo"
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